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28/02/2024

Como Ocorre a Perda da Personalidade Jurídica nas Empresas

 

AUTONOMIA PATRIMONIAL

As sociedades são pessoas jurídicas de direito privado, cuja existência legal começa com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro (Junta Comercial ou Registro Público de Pessoas Jurídicas).  

A personalidade jurídica confere autonomia patrimonial à sociedade, que não se confunde com seus sócios ou administradores.

Uma vez constituída a pessoa jurídica, as obrigações da sociedade recaem sobre o próprio patrimônio, ficando protegidos os patrimônios de seus sócios e administradores.   

Segundo o Código Civil Brasileiro, a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos.

Entretanto, essa autonomia pode ser desconsiderada em caso de abuso da personalidade jurídica, por requerimento do interessado, por declaração do juiz ou por intervenção do Ministério Público.

A desconsideração da personalidade jurídica (ou da autonomia patrimonial) permite ao credor, observado o devido processo legal, alcançar os bens particulares dos sócios e administradores para cobrir obrigações assumidas pela sociedade, no caso de abuso por parte deles.

"A desconsideração da personalidade jurídica configura-se como medida excepcional. Sua adoção somente é recomendada quando forem atendidos os pressupostos específicos relacionados com a fraude ou abuso de direito estabelecidos no art. 50 do CC/02. Somente se forem verificados os requisitos de sua incidência, poderá o juiz, no próprio processo de execução, “levantar o véu” da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens da empresa." (Recurso Especial STJ 948.117 - MS).

A desconsideração não extingue a personalidade jurídica, apenas a suspende para que o patrimônio dos sócios seja utilizado para liquidar as obrigações contraídas pela sociedade.

Abuso da Personalidade Jurídica   

O abuso da personalidade jurídica caracteriza-se pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.

O desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza, com objetivo de lesar credores.

Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da atividade original da pessoa jurídica.

A confusão patrimonial é a ausência de separação de fato entre os patrimônios dos sócios e da pessoa jurídica. Fica caracterizada a confusão patrimonial:

  • Pelo cumprimento repetitivo, pela sociedade, de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; 
  • Pela transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e 
  • Por outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. 

A partir da desconsideração da personalidade jurídica, as obrigações da sociedade serão supridas pelos bens particulares de administradores ou de sócios, direta ou indiretamente beneficiados pelo abuso.

Esses efeitos também poderão ser estendidos à sociedade em relação às obrigações devidas pelos sócios ou administradores. 

Além disso, poderão ser estendidos aos sócios e administradores, no todo ou em parte, os efeitos da falência de sociedade cuja personalidade jurídica for desconsiderada. 

Desconsideração Inversa

Na Resp 948.117, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que "É possível aplicar a regra da desconsideração da personalidade jurídica na forma inversa quando haja a evidência de
que o devedor se vale da empresa ou sociedade à qual pertence, para ocultar bens que, se estivessem em nome da pessoa física, seriam passíveis de penhora".

Veja também: Desconsideração inversa combate abusos na utilização da pessoa jurídica.

Esse e outros assuntos podem ser examinados na seguinte obra:

Parecer_Normativo_Cosit_04-2018 examinou a responsabilidade tributária solidária referida no inciso I do artigo 124 do Código Tributário Nacional que estabelece o seguinte:

Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.

Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;

II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.

Segundo o parecer, a responsabilidade tributária solidária referida decorre de interesse comum da pessoa vinculada ao fato jurídico tributário, que pode ser tanto o ato lícito, que gerou a obrigação tributária, como o ilícito, que a desfigurou.

No caso da responsabilidade solidária decorrente de ato ilícito, a pessoa a ser responsabilizada deve ter vínculo com o ato e com a pessoa do contribuinte ou do responsável por substituição. Além disso, deve ser comprovado o nexo causal em sua participação comissiva ou omissiva, mas consciente, na configuração do ato ilícito com o resultado prejudicial ao Fisco dele advindo.
Segundo o parecer, são atos ilícitos que ensejam a responsabilidade solidária:

  1. Abuso da personalidade jurídica em que se desrespeita a autonomia patrimonial e operacional das pessoas jurídicas mediante direção única ("grupo econômico irregular");
  2. Evasão e simulação e demais atos deles decorrentes;
  3. Abuso de personalidade jurídica pela sua utilização para operações realizadas com o intuito de acarretar a supressão ou a redução de tributos mediante manipulação artificial do fato gerador (planejamento tributário abusivo).

O parecer esclarece, ainda, os seguintes conceitos:

  • Grupo Econômico Irregular: O grupo econômico irregular decorre da unidade de direção e de operação das atividades empresariais de mais de uma pessoa jurídica, o que demonstra a artificialidade da separação jurídica de personalidade. Esse grupo irregular realiza indiretamente o fato gerador dos respectivos tributos e, portanto, seus integrantes possuem interesse comum para serem responsabilizados. Contudo, não é a caracterização em si do grupo econômico que enseja a responsabilização solidária, mas sim o abuso da personalidade jurídica.
  • Atos de Evasão: Os atos de evasão e simulação que acarretam sanção, não só na esfera administrativa (como multas), mas também na penal, são passíveis de responsabilização solidária, notadamente quando configuram crimes. Atrai a responsabilidade solidária a configuração do planejamento tributário abusivo na medida em que os atos jurídicos complexos não possuem essência condizente com a forma para supressão ou redução do tributo que seria devido na operação real, mediante abuso da personalidade jurídica.
  • Abuso da Personalidade Jurídica: Restando comprovado o interesse comum em determinado fato jurídico tributário, incluído o ilícito, a não oposição ao Fisco da personalidade jurídica existente apenas formalmente pode se dar nas modalidades direta, inversa e expansiva.

Veja também a Instrução Normativa RFB 1862, de 27 de dezembro de 2018, que dispõe sobre o procedimento de imputação de responsabilidade tributária no âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Veja também: Existênciade grupo econômico não basta para desconsideração da personalidade jurídica eextensão da falência



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